Muitas vezes empoleiravas-te em mim e cobrias-me de beijos, eram felizes esses dias. Outras vezes dizias coisas absurdas em voz alta. Vociferadas, nomes errados, copos, pratos e tudo o que soubesse voar. De princípio gritava também, esbracejava mas acabava sempre por ter a mais mísera e incompreendida das tuas respostas. Naquele dia disse que não. Estava farto desses dias apinhados de gritos e palavras feias. De dentro da gaveta que estava sob a mesa da cozinha tirei a maior faca que encontrei. Não me lembro de entrar pela sala adentro. Se tinha o cuchilho para cima ou se para baixo, se fui a correr ou mesmo se te disse qualquer coisa, desculpa mas não me vêm agora à memória essa breve jornada até à sala.
Um silêncio mudo… Percebi o teu medo. Também tive disso. Puxei a cadeira junto à mesa com uma mão, sentei-me devagar e pousei o mal com a maior das deferências. Continuamos sem ter nada para dizer ou fazer. Durante esses minutos de imensa quietude senti-me acalorado por uma grande felicidade, estávamos os dois sem gritos e as outras coisas. Toquei com as mãos na lâmina, deste um passo atrás. Sem ideias iluminadas e com a porcaria da faca tão acirrada só me lembrei que a devia espetar num sítio qualquer em que saísse muito sangue. Serrilhei os pulsos a custo e foda-se, doeu mais do que muito… Pousei o mal de contra a mesa e as mãos cheias de sangue também…
Não me lembro do resto mas gosto de ter abeirada a mim em graves e delicados cuidados… Ah como eu gosto dos teus beijos…
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