Há lugares que ficam no outro
lado da rua. Lugares pelos quais passamos, sem saber e sem sentir, umas vezes a
sorrir outras no mais absorto dos pensamentos. Sítios com gente dentro. Gente com
mil e uma cabeças ou sem cabeça, gente que matou gente, gente que já não é
gente e nós do lado de fora, tão aprumadinhos.
Passei por aquela rua vezes sem
conta, muitas das vezes tendo como missão a espinhosa e complexa tarefa de
comprar o Independente e um pacote de paivantes para o avô. Eram os belos
tempos em que os putos ainda conseguiam comprar cigarros. Eram tempos de ter
avô e de ter menos 30 anos nos costados. Ah, como foste um puto feliz.
Voltando aquela rua e aqueles lugares
que nunca vemos e nunca sentimos. Do outro lado do muro, ei-lo no seu circular
esplendor o pavilhão oito do Hospital Psiquiátrico Miguel Bombarda. O seu cheiro
a leite tresmalhado, as paredes rasgadas com as mãos, salpicos de um vermelho
sangue, latrinas cheias de merda e um bando de loucos…
E eu e nós no outro lado do muro…